O papel das igrejas em situações de catástrofe

Reprodução / Nilton Giese

 

Nilton Giese-

Os momentos de catástrofe exigem atitudes ecumênicas das igrejas. Atitudes individualizadas não são efetivas. Em situações de catástrofe as igrejas precisam se reunir e coordenar desde as primeiras ações, que no caso de Brumadinho foi organizar a doação de água, alimentos, roupas, artigos de higiene pessoal. Em menos de 48 horas já havia tanto material que não eram mais necessárias novas doações. Isso aconteceu por causa da enorme solidariedade, mas também porque as igrejas e a sociedade civil foram pressionando a Vale para assumir as necessidades econômicas por essa tragédia.
As igrejas passaram então a atuar em outros espaços de solidariedade. Além de criar redes oração, foi importante levar as pessoas que queriam ajudar para mais perto da catástrofe. Desta forma, foram surgindo várias ações ecumênicas de apoio como, por exemplo, grupos de jovens que foram trabalhar com as crianças de familiares vítimas da tragédia, usando para isso o roteiro das Semanas Bíblicas de Férias. Alguns jovens músicos organizaram oficinas de música, onde ensinavam os jovens vitimados a cantar sua tragédia. Esse mesmo grupo, sob a orientação de um médico veterinário, passou a cuidar dos animais sobreviventes. Os adultos criaram uma lavanderia comunitária para lavar a roupa dos bombeiros militares e várias pessoas se colocaram à disposição como bombeiros voluntários durante o período de buscas de sobreviventes. Houve também um grupo de mulheres que passava de velório em velório, preparando café, água e algo de comer para as famílias enlutadas e, sobretudo, levando um abraço, ajudando as pessoas a se sentirem acompanhadas no momento de seu maior sofrimento. Tudo isso com o apoio financeiro de coletas de solidariedade das igrejas.
Depois de duas semanas, os sobreviventes começam a pensar na reconstrução. Reconstruir não significa apenas levantar paredes. Significa também reconstruir vidas, reconstruir esperanças, tomar decisões em relação ao futuro.
A empresa Vale começou a fazer doações de 100mil reais por cada funcionário morto ou desparecido. No entanto, essa generosidade da empresa pode ter o objetivo de individualizar as demandas por indenização, como aconteceu em Mariana, onde cada um tem seu advogado e passados já mais de 3 anos, ninguém foi indenizado. Por isso, o Ministério Público do Trabalho adverte que as demandas em casos de catástrofes como essa devem ser sempre coletivas. Essa é a maneira correta para lutar com as grandes empresas e conseguir resultados mais rápidos. Por isso, nesse momento da reconstrução é fundamental que as igrejas, no acompanhamento pastoral, também tenham condições de orientar corretamente as vítimas.
Ecumenismo para ações transformadoras
As igrejas devem levantar a voz profética em relação a uma economia que tem por objetivo único o crescimento compulsivo e ilimitado – crescimento da produção, crescimento do consumo, crescimento da extração de recursos, crescimento da poluição, crescimento da catástrofe climática e ambiental. É importante que as empresas se instalam e tragam empregos. Mas devemos nos perguntar sobre os riscos humanos e ambientais dessas empresas.  Aqui em Minas Gerais há ainda 18 barragens de rejeitos de minério de ferro em situação de perigo de rompimento. São verdadeiros monstros que podem devorar pessoas e o meio ambiente a qualquer momento. Então, antes que as empresas se instalem, devemos perguntar pelos riscos e as medidas de prevenção para a proteção da vida humana e do meio ambiente.
Porque servimos ao Deus da vida, isso significa resistir e procurar transformar todos os valores e sistemas destruidores da vida. Pois as consequências das catástrofes nos mostram que se o atual sistema econômico, os padrões atuais de pensamento e comportamento continuarem – como ocorre atualmente – as condições de vida do planeta serão destruídas. Que depois da ajuda emergencial, as igrejas possam continuar se reunindo dentro de um movimento ecumênico para avaliações críticas e ações transformadoras.
Na quarta-feira seguinte à catástrofe, dia 30 de janeiro, já no final da tarde, o céu escureceu e, por alguns instantes, o vento soprou forte derrubando árvores. Quase não choveu, mas o barulho de trovões foi intenso. Parecia que o Espírito de Deus estava pairando, desolado, sobre aquela destruição deixada pela catástrofe da Vale.
Autor é pastor da Comunidade Evangélica de Confissão Luterana em Belo Horizonte

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