Igrejas americanas estão conseguindo barrar lobby das armas

 

Foto: Pixabay

CONIC/ALC-Investindo em fabricantes de armas para mudar suas práticas: esta é a aposta de muitas Igrejas estadunidenses após o massacre de Parkland, cuja comemoração do primeiro aniversário será nesta quinta-feira, 14 de fevereiro.

A reportagem é de Alexis Buisson, publicada por La Croix, 12-02-2019. A tradução é de André Langer.

A irmã Judy Byron não estudou finanças, mas ela sabe de cor as engrenagens do mercado de ações. Esta freira católica é a figura de proa de um movimento que está se desenvolvendo dentro das Igrejas americanas: o ativismo dos acionistas. Morando em Seattle, ela lidera a Coalizão Noroeste para o Investimento Responsável (NWCRI, sigla pelas suas iniciais em inglês), uma aliança que reúne uma dúzia de grupos cristãos em torno de um objetivo: entrar no capital de empresas para levá-las a agir sobre os males da sociedade, como as injustiças sociais e a degradação ambiental. “Nós nos damos conta de que poderíamos fazer muito mais estando presente na mesa das empresas”, disse Judy Byron.

Um ano após o massacre na Marjory Stoneman Douglas High School, em Parkland, Flórida, onde 17 pessoas morreram, esses investidores cristãos estão se concentrando na luta contra a violência ligada às armas. No final de dezembro, uma diocese da Igreja Episcopal de Massachusetts votou pela aquisição de ações da American Outdoor Brands, uma revendedora de armas que possui uma subsidiária na diocese.

Ela pretende comprar 200 ações, o que lhe dá o direito de fazer uma pergunta à administração na próxima assembleia geral. “Há um sentimento de frustração porque o governo não está fazendo nada quando 97 pessoas morrem todos os dias por causa de armas de fogo”, disse o bispo Douglas Fisher, líder da diocese. “Os fabricantes de armas precisam tomar como exemplo o que as montadoras fizeram para proteger seus produtos”.

Uma nova perspectiva

Outras dioceses devem seguir o exemplo: as autoridades nacionais da Igreja Episcopal decidiram, em sua convenção em julho de 2018, fazer da luta contra a violência armada uma prioridade de sua política de investimento. A Igreja dispõe de mais de US$ 400 milhões em ativos.

Essa perspectiva é nova nas Igrejas americanas. Até agora, os grupos religiosos engajados em ações corporativas privilegiavam estratégias de desinvestimento. A tradição remonta a 1971, quando a Igreja Episcopal dos Estados Unidos pediu à General Motors, da qual era acionista, a suspensão das suas atividades na África do Sul como forma de protesto contra o apartheid.

Nesse mesmo ano, nasceu o Centro Interconfessional de Responsabilidade Corporativa (ICCR, sigla pelas iniciais em inglês), um grupo de investidores religiosos que procura incentivar empresas a se envolverem em causas sociais. Os membros desse grupo, que inclui católicos, presbiterianos, ou ainda menonitas, investiram em vários setores, desde o tabaco até as grandes redes de supermercados, para influenciar várias questões, como a proteção do meio ambiente, o acesso a medicamentos e o respeito aos direitos humanos.

Assentar as bases para um diálogo construtivo

“Isso pode ser visto como uma compra de acesso”, admite o bispo Ian Douglas, presidente do grupo pró-controle de armas dos Bispos Unidos Contra a Violência de Armas e membro da Igreja Episcopal Americana. Ele vê nisso uma oportunidade para “assentar as bases para um diálogo construtivo”. “Para garantir que armas mais seguras sejam fabricadas, é preciso fazer parte da discussão”.

Os defensores dessa estratégia ganharam fôlego com algumas vitórias. Em maio de 2018, uma resolução apresentada pelos membros do ICCR, solicitando que a companhia fabricante de armas Sturm Ruger publicasse um relatório sobre suas ações para tornar seus produtos mais seguros, foi adotada por 69% dos acionistas, entre os quais está o principal investidor, a BlackRock, uma empresa líder em gerenciamento de ativos. “Eu vejo um crescente número de jovens se envolvendo nessa luta”, diz a irmã Judy Byron, “o que é animador em um momento em que as comunidades religiosas estão em declínio”.

Fonte: IHU Unisinos

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