Mãos Limpas?

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Oneide Bobsin-

Nenhuma pessoa influente gostaria de ficar para a história como Pilatos. Todas as vezes que as comunidades cristãs recitam, depois de mais de dezesseis séculos, o Credo Apostólico, lembra-se que Jesus fora crucificado sob o seu poder. Certamente ele – e ninguém mais – gostaria de ser lembrado desta forma. Também é lembrado como Governador e Juiz que não viu em Jesus crime algum, mas que lavou as suas mãos diante da pressão das lideranças religiosas e políticas, entregando-o para a crucificação e a morte (João 18 e 19). Assim, é lembrado como um covarde diante do Justo. Quem lava as mãos desta forma, certamente as têm como sujas.

Diante das revelações nos últimos anos de desvios de dinheiro público que regava campanhas eleitorais e que já colocou gente poderosa na prisão, de forma breve e branda, e do retorno ao governo de uma parte pequena do que foi desviado, começa-se a lembrar da operação Mãos Limpas, registrada na Itália. Estaríamos nós, aqui no Brasil, reeditando a famosa operação italiana que prendeu empresários e políticos, aliados na corrupção? Com aquela ação os partidos políticos sofreram grandes revezes, mesmo que os processos tenham sido estritamente jurídicos. Com os desgastes dos partidos ocorreu, posteriormente, a eleição de Berlusconi, um empresário que derrubou direitos coletivos e foi julgado por abuso sexual de menores. A frustração com os políticos geralmente fere a política como meio de afirmação de vida, especialmente para as classes excluídas, oportunizando o surgimento de messias que fogem da cruz.

A luta feroz contra a corrupção deve se pautar contra as ações, mas não contra as instituições e o Estado de Direito, como está acontecendo no Brasil. Não se combate a corrupção ferindo a Constituição e partidarizando as ações jurídicas. Assim, a Operação Lava-Jato, que inspira seu nome num posto que lavava automóveis, pode se transformar numa operação tão limpa quanto as mãos de Pilatos. Por enquanto se quer lavar a jato só um lado do automóvel.

Vemos, pois, desta forma, que há um vazamento seletivo de informações dos processos jurídicos para atingir o Governo eleito democraticamente, como se a corrupção, real e verdadeira, fosse uma descoberta recente na história brasileira.

Fazer uso partidário e político do combate à corrupção para dar um golpe na democracia é relegar a operação Lava-Jato ao nível do gesto de lavar as mãos de Pilatos. É covardia descarada das elites que não querem a continuidade das políticas públicas que tiraram mais de 40 milhões de pessoas do mapa da fome, abriram universidades públicas como nunca na história, criaram programas de auxílio financeiro aos mais necessitados, além de programas de inclusão. Disto não se fala na grande mídia que tem repulsa aos pobres. O uso político elitista do combate à corrupção várias vezes foi usado, na história recente, como pretexto para derrubar governos com programas minimamente populares.

No momento, a mangueira da operação Lava-Jato está vazando água para Pilatos lavar as mãos e condenar o Justo. Contudo, há esperança. Deus fez ressurgir quem foi crucificado num processo fraudulento. Portanto, nosso Deus tem lado; o lado dos que estão embaixo e querem a vida digna.

Nunca é demais lembrar uma frase do grande escritor brasileiro Guimarães Rosa, em sua obra “Grande Sertão: Veredas”, cujo personagem central disse de si que foi parido para ser padre ou chefe de jagunços, optando pela segunda; e que gosta de ir na casa de um crente metodista onde todos se acusam de pecadores. Afinal, todos pecaram e carecem da glória de Deus (Rm. 3,24).

Mãos limpas, sim, mas não como a de Pilatos.

Autor – ex-reitor da Faculdades EST

 

 

 

 

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