Audiência pública explora contribuições das religiões à sociedade do Brasil

Na última terça-feira (13) foi realizada audiência pública proposta pela comunidade bahá’í do Brasil e pelo movimento inter-religioso Espiritualidades em Ação para debater sobre as manifestações culturais e religiosas do povo brasileiro. Com relatoria do Deputado Federal Padre João (PT-MG) e presidência da Deputada Federal Érika Kokay (PT-DF), as discussões lançam luz à contribuição das diferentes tradições religiosas para a construção de uma visão coletiva sobre quem somos como sociedade, reconhecendo a relevância dos princípios espirituais para a cultura do país.

Ao abrir a sessão, Érika Kokay enfatiza a inseparabilidade da existência humana de sua natureza espiritual, “Se se nega o exercício da espiritualidade, é como se estivesse arrancando um aspecto fundamental da existência humana”, menciona.

Luiza Cavalcanti, representante da comunidade bahá’í, sugere que a consulta considere a diversidade cultural não apenas como uma questão de defesa ou preservação, mas como meio potente para gerar transformação. Menciona, ainda, a necessidade de se estabelecer um processo de aprendizagem amplo, através do qual pessoas e comunidades possam distinguir entre aqueles elementos da cultura que levam ao progresso da sociedade e os que conduzem à desintegração do tecido social. “Esta é uma área em que ciência e religião precisam colaborar. Uma transformação significativa das condições da sociedade não envolve simplesmente a aquisição de habilidades técnicas, mas também o desenvolvimento das qualidades e atitudes que estimulam os padrões cooperativos de interação humana”, comenta.

Durante a audiência foram levantadas questões centrais sobre o papel das religiões e da cultura na superação da polarização vivenciada pela sociedade brasileira nos últimos anos. O gestor de políticas públicas e idealizador dos Pontos de Cultura, Célio Turino, reforça a importância da cultura do encontro para a promoção do diálogo, fundamental para a construção de uma sociedade mais justa. Célio aproveita para chamar atenção para a urgência de se promover uma atuação pautada na potência dos povos, em sua capacidade de agir e transformar a si mesmos e a realidade ao seu redor. “Pode ser um caminho para que o povo brasileiro consiga cerzir de volta esse tecido roto da democracia, da convivência, da paz, da justiça social e da solidariedade”, reflete.

Makota Célia, coordenadora nacional do Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-Brasileira (CENARAB), reforça a importância do Parlamento em garantir a liberdade de associação e crença, assim como a laicidade do Estado brasileiro que tem sido ainda mais fragilizada em anos recentes. Sobre isso, a secretária-geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC), pastora Romi Bencke, enfatiza que a liberdade religiosa deve ser considerada “a partir de outras questões que recortam esse direito, como por exemplo, o racismo, o patriarcalismo e a violência”, conclui.

Nessa mesma direção, Jailson de Souza e Silva, fundador do Observatório de Favelas e do Instituto Maria e João Aleixo (IMJA), relembra a centralidade de superar pressupostos que violam a dignidade humana no Brasil contemporâneo. São eles o racismo, o patriarcalismo e o patrimonialismo. Para além de apontar os desafios, Jailson propõe como parte da solução uma educação integral, fundamentada no desenvolvimento da racionalidade científica, de princípios éticos e de uma dimensão estética que ressignifique o conceito de beleza. Segundo o diretor do IMJA, isso será possível apenas a partir da construção do que ele chama de “pedagogia da convivência”. “Nós precisamos, na defesa do estado laico, construir a partir de legislações, a partir de iniciativas de políticas públicas, espaços de convivência cada vez mais diversos, não apenas do ponto de vista religioso, mas do ponto de vista racial, do ponto de vista de gênero e de todos os pontos de vista que sustentam a vida social a partir da diversidade. É na construção de uma pedagogia da convivência de forma sistemática, regular, como política pública que poderemos trabalhar cada vez mais o princípio de uma educação integral”, afirma.

Marina Ribeiro, cientista social, educadora popular e coordenadora da ONG Criola, reflete sobre o papel das mulheres negras para construção da sociedade e ressalta, ainda, que os atos de intolerância contra as religiões de matriz africana são mais uma expressão do racismo que estrutura a sociedade brasileira. Somando a essas contribuições, a artista e pesquisadora em direitos humanos, Daiara Tukano, faz um apelo à Casa Legislativa para que considere estabelecer parâmetros que permitam tipificar a violência contra o patrimônio cultural e imaterial, de modo a judicializar e responsabilizar os envolvidos.

Sinalizando a necessidade de continuidade do debate, a Deputada Érika convoca aos presentes a prosseguirem o diálogo, aprofundando as implicações, dentre outros aspectos, da laicidade do Estado e sua relação com a democracia, da conexão entre ciência e religião na construção de alternativas para uma sociedade mais justa e da adoção da pedagogia da convivência como lógica subjacente a todas as políticas públicas.

Com informações da Comunidade Bahá’í do Brasil
Imagens: Reprodução

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